INCÊNDIO INSPIRA CRIAÇÃO DOS B. V. ARRIFANA
Um violentíssimo incêndio no Furadouro, na noite de 25 de Março de 1925, bem visível da parte mais alta de Arrifana, constituiu poderoso e decisivo sinal de alarme que impulsionou a criação de um Corpo de Bombeiros na freguesia.
“Este terrível sinistro, destruiu 200 palheiros, incluindo 4 casas de pedra e cal, deixado sem abrigo 300 pessoas e 6 ruas completamente destruídas pelos escombros.”
O extinto quinzenário “O Arrifanense”, dirigido por Manuel José Pereira, na sua edição de 2 de Abril, dedica mais de metade da primeira página ao acontecimento com o sugestivo título “Um pavoroso incendio”, do qual respigamos:

Do alto da freguezia o incêndio descobria-se perfeitamente dando a ideia nítida do seu incremento e das suas proporções. Viam-se distintamente as labaredas afogueando o espaço e as colunas espessas de fumo subindo em espiral e pondo uma mancha escura n’aquelle fundo de tragedia.
Assistia-se confrangido ao alastrar do fogo, adivinhando as nossas almas emocionadas a tortura desvairante dos infelizes que viam sumir-se os seus haveres na voragem d’aquelle sinistro brazeiro.
Correlativamente o nosso espírito concentrou-se, n’elle perpassou a visão sombria d’estas hecatombes e simultaneamente lampejou uma ideia: adquirir material de incendio que, relativamente, posesse a freguesia a coberto d’estas tragedias.”
“Os recursos da freguezia não são grandes. O momento que se vive é mais de preocupações do que desafogo. Porém a Junta de Melhoramentos encontrará maneira de, sem sacrifícios pesados para ninguem, levar por diante esta ideia dando-lhe corpo e efectivação.
Não podemos sonhar sequer com a organização d’uma corporação de bombeiros dotada com todo o mate- rial necessário para um serviço perfeito e modelar. Mas podemos pensar na aquisição do material indispensável: uma bomba aspirante premente de jacto continuo, um tanque impermeável, de lona, mangueiras e agulhetas e uma escada articulada. É pouco? Não. É muito. É tudo. Porque a dedicação, a coragem, a boa vontade, o decidido esforço de todos nós, que numa hora de perigo não ficariamos inermes, suprirão todas as deficiencias.”
“De todas as contingencias a que cada um está sujeito, o fogo, de ação tão destruidora e efeitos tão perniciosos, é a que mais ha a temer!
N’uma hora, n’um instante, desmantela o nosso lar, impele-nos da riqueza para a ruina, do conforto para o desabrigo.
Ainda que nos poupe a vida, arrebanha os nossos haveres. E pela sua guela hiante desaparecem, tragadas vorazmente, as economias de uma vida inteira, as migalhas que se amealhavam quantas vezes num labor árduo e mortificante.
Pois contra a ferocidade deste monstro a freguezia está completamente desarmada. E todavia se nós quizermos, se todos nós quizermos, podemos, sem sacrifícios, prover-nos do unico escudo que pode parar eficazmente os seus impetos e a sua sanha: material d’incendios.
A Junta de Melhoramentos chama a si o encargo de procurar adquiri-lo. Em boas mãos está, ponto é que a freguezia reconheça o alto beneficio que resulta da sua realização.“
Este apelo, impregnado de veemência e lucidez, alertou sobremaneira a comunidade para o grande problema do fogo e, volvido algum tempo, a pena inspiradora e determinada de Manuel José Pereira, “O Arrifanense”, assim como o semanário “Correio da Feira”, através do seu solícito correspondente local, Alcides Rebelo Moreira, constituiram-se como grandes dinamizadores e veículos difusores dos sentimentos generosos e bairristas da população de Arrifana, e não só, como se pode constatar na primeira lista de donativos, publicada na edição de 20 de Agosto de 1926:
Esta campanha, que motivou a realização de leilões de oferendas e trouxe a Arrifana o Grupo Dramático Alegria, da Mocidade Portuense, inspirador da actuação de dois grupos cénicos locais, rendeu a quantia de 8.956$00, o que, acrescida da oferta da Junta de Melhoramentos, no valor de 1.914$25, e dos empréstimos de 2.377$20, de Manuel José Pereira, e de Manuel Nunes de Azevedo, de 1500$00, deu um total de 14.747$45, o que possibilitou a tão ansiada aquisição de material de incêndio, tendo a moto-bomba, da marca Delahaye, custado 13.638$40.
Esta inestimável relíquia, assim como a Escol que se lhe seguiu, ainda existem, estão esmeradamente conservadas e, naturalmente, farão parte do projectado museu.
NASCIMENTO DA ASSOCIAÇÃO

